Algumas rapidinhas:
- Eu não sabia, e me espantou: o Brasil é o único dos 181 países da ONU onde os vereadores (ou cargo semelhante) são remunerados. O único! Conselheiro municipal é função voluntária: o sujeito vai, dá seus palpites para a prefeitura, discute as normas públicas, volta pra casa.
- O que fazem nossos vereadores? Menos que isso. Levantamento recente mostra que 95% dos projetos aprovados pela Câmara do Rio foram cosméticos, como nomes de rua e menções honrosas. 95%. Multiplique essa inoperância por 5 mil municípios e seus milhares de vereadores. Agora pense que são todos remunerados. E muito, muito bem remunerados. Agora pense nos assessores/parentes/amigos que empregam para ajudá-los na nobre função.
- Cotas raciais. É um nó cego na minha cabeça. A desigualdade racial no Brasil é inegável. Mas políticas raciais não me convencem. Mas admito que era bonito quando eu trabalhava na UERJ e via alunos negros circulando no campus. Deveria ser normal. Pois não havia um único, nem um unzinho, em minha graduação na PUC. Nem professor. A desigualdade é inegável. Mas como superá-la?
- Acabo de entrevistar Beatriz Bissio para a RHBN em dezembro. Em 1974, ela fundou os Cadernos do Terceiro Mundo, em Buenos Aires. Sempre fugindo das ditaduras latinas, foi a única revista a cobrir in loco a independência de Angola e Moçambique, em 1975. Os Cadernos passaram a ser editados em português para alfabetizar adultos angolanos. Sempre na contramão da grande imprensa, na era pré-internet, ela também entrevistou Arafat e Saddam Hussein, e acompanhou os conflitos no chamado terceiro mundo, com um jornalismo analítico e independente.
- Os Cadernos chegaram ao número 249. O histórico 250 estava pronto, mas não foi rodado por falta de verba. Em 2005. "Não tivemos dinheiro para imprimir. Sobrevivemos a todas as ditaduras, na base da garra e do pulmão, e fomos morrer no governo Lula". Ela tem freqüentado o Itamaraty para um trabalho de assessoria. Lá, não falta assunto. "É incrível a quantidade de gente que me diz que virou diplomata por causa do Cadernos do Terceiro Mundo".
- Beatriz também pede que o governo preste, enquanto é tempo, uma homenagem a Ovídio Melo. Ele era embaixador em Angola em 1975, e graças a seu trabalho o Brasil foi o primeiro país a reconhecer a independência daquele país. Nós em plena ditadura, Angola derrubando o colonialismo de um ditador, e com um movimento socialista! "O Itamaraty tem que prestar uma homenagem em vida a Ovídio. Se temos priorizado as relações com Angola, vale reconhecer a importância daquele gesto histórico. Os angolanos até hoje têm gratidão por isso".
Até que enfim é sexta-feira
Há 12 anos
4 comentários:
sou a favor das cotas raciais. Acredito que o Estado tem que pagar a divida com qualquer minoria que tenha sido prejudicada por suas acoes passadas (?).
E se tiver que ser sob medidas legais, entao que seja.
Pior do que os vereadores terem salário é termos mais de 5000 municípios. O custo de manter tantas prefeituras e câmaras municipais é absurdo. Boa parte não arrecada um centavo e vive à custa do Governo Federal. Agora, mudar isso, é quase impossível.
As cotas, infelizmente, não resolvem o problema. O sistema mais sensato de cotas que vi está em tramitação no Congresso: haverá uma "cota social", de 50% das vagas das universidades para pessoas carentes. Desses 50%, haverá uma parcela para os negros, de acordo com o percentual de negros no estado. Assim, na Bahia a cota para negros será maior e no Rio Grande do Sul provavelmente será bem menor.
Bila, esse problema da "dívida" é complexo. Num caso extremo hipotético, se formos pagar toda a dívida, teremos de sair quase todos e deixar o Brasil para os índios. Afinal, eles nunca pediram para serem "descobertos".
Cadernos do Terceiro Mundo fez parte da minha infância. Minha mãe lia e eu, de alguma forma, fui influenciado. Bom, o Terceiro Mundo acabou, os Cadernos também. Acho que os temas políticos hoje têm outro matiz.
Pois é, nunca tinha ouvido falar no Ouvídio Melo. Mas os livros de história adoram contar que o Brasil foi o primeiro a reconhecer Angola.
Zoon, concordo que falar em divida e complexo, mas acho tambem que o pagamento da divida nao seja necessariamente a reversao do mal causado. Como normalmente ocorre na vida mesmo (menos quando estamos falando de dinheiro). Portanto, no caso dos indios, eu acho que o pais tem que pagar pelo prejuizo ja causado as populacoes indigenas tambem, talvez o reparo seja, por exemplo, fazendo uma inclusao inteligente deles aos mundo contemporaneo.
quando a conversa chega aos índios, o grau de complexidade vai à lua...
tente dizer a um antropólogo (ou a um índio mesmo) que defende "incluir eles no mundo contemporaneo"...
Eles vivem em outro mundo, têm outra cabeça, não querem saber de ser incluídos.
A tragédia (ou "coisas da vida") é que o tempo não pára, e na história das transformações humanas eles estão cada vez mais espremidos. Por sorte hoje existe alguma consciência dos direitos deles. Então os poucos que sobreviveram ainda têm reservas. Graças à política dos brancos.
Mas vá ver como vivem lá. Para eles, se o sonho ainda não acabou, tá cada vez mais ameaçado...
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